O que pode correr mal num SOTA (X)

Porcaria de WX para amanhã

Com o Outono à porta e o Inverno a caminho, chegou o momento de impermeabilizar o equipamento de SOTA. As últimas duas semanas foram de céu nublado nos dias úteis e fins de semana com aguaceiros. O meu corpo já estava a ressacar da falta de RF ao ar livre. Na lista de espera estão as Penedas (MN-008 e MN-017) mas as previsões meteorológicas não autorizam caminhadas sobre penedos molhados. Impõe-se a escolha de um cume mais baixo e mais perto do QTH: CT/MN-048 Monte de Góis (erradamente referido como “Vila Nova de Cerveira”, nos documentos oficiais SOTA).

D-1 / 2155Z: Última consulta às previsões meteorológicas de 4 fontes diferentes, último contacto BF com o CT1HIX para rever alguns detalhes. 50% de probabilidade de ocorrência de precipitação de cerca de 1mm/3h com vento fraco a partir das 1000Z… Vamos nessa Vanessa!

Dia D / 0400Z: Wake up! Às 05:30 temos de estar no “meeting-point” (N41.909050 – W008.760976) onde ficarão os carros e de onde seguiremos a pé até ao cume do Monte de Góis. São cerca de 2300 metros de estrada de terra batida e pedra, devidamente sulcada pelas chuvas, porém “navegável” em veículo Todo-Terreno.

Segundo o estudo prévio do caminho, o ganho em altura é de apenas 160 metros. No entanto, este ganho é apenas acumulado nas últimas centenas de metros do caminho; aquilo sobe, sobe, sobe!

Meeting-point: São 0530Z, está uma escuridão que só não é total graças à poluição luminosa que é reflectida no tecto de nuvens. Ainda assim, são precisos alguns minutos para os olhos se adaptarem à luz ambiente, depois de ter extintos todas as luzes do carro, telemóvel ou GPS.

Chegou o companheiro de SOTA, o colega e amigo Gomes (CT1HIX); não está a chover, apesar da chuva que nos acompanhou nos respectivos caminhos desde os respectivos QTHs. Mochilas às costas, canas de pesca à mão, última confirmação de que tudo está pronto para seguir viagem e de que os carros ficam trancados, aí vamos nós! Às escuras que lanternas é para meninos! Não, não foi isto que correu mal, havia lanternas mas não fizeram falta… 🙂

O caminho fez-se bem, polvilhado com breves pausas para deixar o corpo habituar-se ao ganho de altitude, cof cof cof… arrrf!  Umas das vantagens de não caminhar sozinho é a caminhada parecer mas breve do que ela é. E se a conversa for radio-eléctrica, tanto melhor. Ao chegar ao fim do caminho (ver trilho aqui) encontra-se um portão aberto que dá acesso a um complexo de emissoras diversas e de um PT com um alpendre apropriado para abrigar das intempéries, um par de sotistas. Do outro lado deste complexo, fica o Vértice Geodésico.

Radioamador abrigado da chuva e do vento, "protegido" dos mosquitos

Chegados ao cume, salta à vista a falta de espaço para dipolos de HF. Na imagem acima, vê-se o dipolo da banda dos 40 metros, cujas extremidades dos braços ficam a uns míseros centímetros da cerca metálica. O local aparenta uma certa falta de cuidado com a vegetação a recuperar o terreno que outrora lhe foi tirado, mas aquele alpendre valeu ouro nesta manhã chuvosa.

O que mais podia correr mal nesta activação? Os mosquitos que nos devoraram sem dó nem piedade e cujas proboscis eram tão eficazes que até através da roupa chegavam onde estava o néctar. Entre outros papos aqui e acolá, eu fiquei com três nádegas, o Gomes voltou para casa com um olho à Camões. Sacanas dos mosquitos do campo não gostaram de ver o seu lar invadido; ou será que adoraram? Afinal, não é certamente todos os dias que provam sangue de sotista, enriquecido com o precisoso RF da mais alta sintonia… (vou ali tomar umas gotas).

E ainda? QRM? Já estamos habituados. Neste local, S8 para quem quiser, nos 40 metros.

Enquanto operamos, a chuva intensificou-se e veio acompanhada de um vento fraco. Apesar de todos os preparativos de impermeabilização do equipamento, foi já depois da activação que surgiu um aspecto no qual não tinha pensado. O equipamento e o operador (neste caso, eu) foram para o cume bem acondicionados, à prova de água. Do que não me lembrei, é que depois da activação à chuva, a antena e o coaxial estariam molhados e teriam de voltar para dentro da mochila, juntinho do rádio!!! Valeu-me o par de calças impermeáveis que trazia na mochila para embrulhar a fiarada. A juntar ao check-list para o próximo scuba-sota: uns sacos estanques, um pano absorvente e eventualmente, um saco de gel de Sílica para ir absorvendo humidade do ar dentro da mochila, durante o transporte.

A descida foi toda feita sob uma chuva um nadinha mais pesada do que a de molha tolos (molha parvos, morrinha); ainda assim chegamos aos respectivos carros com as capas completamente molhadas. Para trás ficou o cume e a dupla satisfação de lá ter ido e de o ter activado.

CT/MN-018

Concluindo, pela parte que me toca, foi um SOTA molhado mas validado com um S2S entre os dez QSOs, dos quais destaco o meu primeiro contacto com os Estados Unidos da América, em 40 metros SSB. Curiosamente também, esta foi a primeira activação (das trinta já realizadas) em que nenhuma estação espanhola atendeu as minhas chamadas; porque será? Seria da QTR? 🙂

73 de CT7AFR, Emmanuel.

selfie

O que pode correr mal num SOTA (IX)

Ligação improvisada do coaxial ao balun
Ligação improvisada do coaxial ao balun
Há dois dias publicava mais um episódio desta saga (o XVIII), sem imaginar que na activação seguinte iria ter motivos para escrever mais acerca do que pode correr mal numa actividade Sótica…
 
Hoje é feriado, é dia de não-trabalho, as mulheres da casa querem passar o dia em pijama… Então para mim, hoje é dia de SOTA! Nas três activações que fiz recentemente com o colega CT1HIX (Gomes), avistamos sempre o cume da Bouça dos Homens (CT/MN-009). O Gomes já o tinha facturado, eu olhava para ele de canto. O acesso é fácil, tão fácil que dá para ir de carro. Quem quiser ir a pé, não chega a palmilhar uma hora se seguir pelo estradão que começa na estrada municipal M503; são cerca de dois quilómetros (sempre a subir).
 
Chegado ao local, fiquei contente por ter rede GSM que me iria permitir autospotar. Em vez, de activar na coordenadas SOTA, fui até ao Vértice Geodésico (VG Fojo) por duas razões: 1) à vista desarmada parece esta mais alto que o ponto SOTA; 2) o marco dá jeito para segurar na cana de pesca. 🙂
 
Cheguei ao local, fiz o meu videozeco 360º ( https://www.youtube.com/watch?v=W7yQniIIM9I )e montei o shack. Ligo o rádio e, apesar dos muitos geradores eólicos nas redondezas, QRM nulo e a minha frequência habitual estava aparentemente livre! Yupiiii, pensei logo para mim… Porém, quando começo a perguntar na frequência “Is this frequency in use?”, do canto do olho vejo que não podia ter mais estacionárias!!!! Rapidamente espreitei a ligação do coaxial ao rádio, conferi que os braços do dipolo continuavam como os tinha deixado e olhei para o balun para ver se me teria esquecido de ligar o coaxial a este. Nada. À primeira vista, não via nada.
 
Baixei o mastro e mal puz a mão no balun, ouvi o rádio a gemer. Afinal sempre havia um pouco de QRM na banda, afinal havia um mal contacto entre o coaxial e o balun… Afinal o cabo RG-58 estava partido junto da ficha BNC que ligava ao balun. Bolas!!! E agora?
 
Bom, ir para casa de bolsos vazios estava fora de questão. Tentar 4 QSOs em 2 metros iria ser complicado com a antena de borracha e dificilmente encontraria um caçador de SOTAs nos 2 metros ali por perto. Junto a um gerador eólico estava uma carrinha da ENERC0N; certamente estariam técnicos a trabalhar nessa torre. Pensei em ir lá cravar o ferro de soldar deles, acreditando que teriam um… Não, optei por outra hipótese, mais fácil e rápida. Cortar o cabo um pouco abaixo da ficha BNC, descarnar uns 5 centímetros e enrolar as partes directamente no balun (ver foto). A solução ficou feia mas tinha de funcionar. Perdi uns dez a quinze minutos com esta avaria.
 
Operacional, apesar de algum QRM, os “meus” 7,183 MHz estavam livres, à minha espera. Chamei, autospotei-me no Sotawatch, mas mesmo assim demorou até ao primeiro QSO, depois foram mais seis e fiquei com mais um dia duplamente ganho (passeio e validação do SOTA). Curiosamente, pela primeira vez, os espanhóis ficaram em minoria: 1 EA, 1 CT, 1 PA, 1 ON, 1 M3 e 2 G.
No fim de contas, uma das BNC do meu coaxial avariou ao fim de uma quarentena de utilizações entre SOTAs e outras activações. Só a autópsia revelará a verdadeira causa da avaria…
73 de CT7AFR, Emmanuel.

O que pode correr mal num SOTA (VIII)

Activando o Alto da Pedrada (CT/MN-001)
Activando o Alto da Pedrada (CT/MN-001)

No passado sábado, activei o meu vegésimo sétimo cume; mais uma vez, na companhia do colega Gomes (CT1HIX). Há uns meses, quando pensamos em activar um cume juntos, estavamos a pensar no CT/MN-001 (Alto da Pedrada). Porém, enquanto não metemos os pés a caminho deste cume, activamos outros na mesma região: uma delícia.

Chegou então a vez do tão adiado MN-001. Como sempre, muito trabalho de casa, muitas conversas telefónicas, muitos chats no Fuças ou por e-mail, mas sempre com um olho nas cartas (virtuais) e outro nas previsões meteorológicas. Em relação ao WX, até tefigramas consultamos para estimar se o cume estaria no meio da “sopa” ou não. 🙂

É no capítulo das cartas que a coisa pode também correr mal… Ressalvo já que o “correr mal” é relativo; mau mau seria torcer um pé, partir uma perna ou apanhar uma descarga atmosférica, por exemplos.
Voltando às cartas: CUIDADO com o Google-Terra e os seus perfis verticais, aquilo mente mente mente; aliás, mente mais que um meteorólogo! Passo a explicar. Quando preparo uma ida a um cume, procuro por trilhos eventualmente existentes, no capítulo Tracks do SOTA, no wikiloc, nas cartas topográficas (se tiver) e nas imagens aéreas do Google-Terra. Se não aparece nada, traço uma recta entre os pontos de partida e de chegada e procuro percorrer esta linha contornando buracos e paredes.

Para o passado sábado, o trilho estava traçado: saída da Branda de Gorbelas, subida em direcção ao cume com passagem turística por um fojo (lobos). Encontram-se na Net vários trilhos com o mesmo percurso inicial que o nosso; portanto, não inventamos nada. O que não esperavamos no local, por engano do perfil vertical do GE, é ter de caminhar numa calçada (sim, calçada) em pontas de pés, de tão íngreme que é. Mas quem subiu ao “Concieiro” (i.e., Penameda), já não se assuta com facilidade. Não se assusta, mas passados 10 minutos fica com os “bofes de fora”. Aquilo começa mesmo “a matar”. Convém fazer aquecimento prévio antes de meter calcantes a caminho. Ou então, fazer como nós: devagar…

O segundo inesperado do dia foi provocado por excesso de confiança (entenda-se, falta de experiência minha) nas pilhas recarregáveis NiMH. Após muitos trilhos com pilhas destas no meu GPS, nunca tive problemas até ao passado sábado. Levo duas no GPS (Etrex 30x) e outras 2 ou mais na mochila, carregadas; pensava eu…

Ao quilómetro N, já perto do fim do fojo, a cerca de 500 metros do cume, o GPS dá-me aviso de pilha fraca. Pelo sim pelo não, resolvi substituir. Não precisava do GPS, a visibilidade era óptima, apenas umas núvens brincavam às escondidas com o Sol e o cume estava “já ali”. Coloco as plhas “carregadas” e? Nada! Ora bolas; teria cometido algum erro em casa? Coloco o outro par de pilhas “carregadas” e? Nicles picles!… «Arre! Não preciso do GPS mas quero gravar o trilho». Valeu-me o amigo Gomes que me ofereceu um par de pilhas alcalinas (por escrever isto, lembro-me agora que não reconfigurei o GPS de pilhas recarregáveis para alcalinas). Obrigado Gomes! 😉

O que aprendi com esta estória:
1) As pilhas NiMH (as minhas são de 2450 mAh), apesar de terem apenas meia dúzia de ciclos de carga, descarregam-se em menos de 2 meses após uma carga completa. Ou seja, deve-se carregar as pilhas na véspera para garantir a frescura dos electrões.
2) Ter sempre à mão, um par de pilhas alcalinas. Mesmo que se leve pilhas recarregadas.

No final de contas, tendo chegado ao cume o dia foi positivo: Caminhamos quase 10 km com paisagens deslumbrantes, visitamos um fojo, encontramos duas caches, atravessamos a nascente do rio Vez, vimos um Cervo, muitas perdizes e vacas cachenas. E com isto, somei 7 QSOs difíceis (bad propagation) com um F, um G e 5 EA.

73 de CT7AFR, Emmanuel.